sábado, agosto 13, 2011

Enquanto a gente corre


É que, enquanto a gente corre, não é possível ver os pássaros. Enquanto nos colocamos como personagens da vida sem tempo, não admiramos a lua cheia amarela e escandalosa acima de nossas cabeças doloridas. São as agruras dos tempos sem tempo, dos dias que acabam antes de ter-se tempo de fazer tudo que julgava-se ter a fazer. Enquanto a gente se entrega ao ritmo interrupto de não poder controlar as ações que nos guiam, não temos trégua para receber um abraço de mão estendidas. Nos encontramos, pois então, nos apertos de mão, nos protocolos que nos dizem que não, não há tempo. Não dá para visitar o avô adoentado. Não é permitido dormir até mais tarde (o mais tarde sem horário, diga-se), não podemos admirar o sol quente que tanto incomoda nossas cabeças. Nem mesmo vivemos a temporada de estar conosco mesmo, a sós, como dizem as psicólogas da vida (nossas avós, mães, amigos, desconhecidos, livros e até mesmo as próprias psicólogas), com o nosso EU. Aquele, que sempre dizemos que somos, mas não necessariamente estamos. Enquanto a gente corre, não podemos admirar uma plantação de girassóis. Nem mesmo observar o olhar admirado dos nossos filhos, afinal, estamos com pressa.

É porque quando a gente corre, apressados pelos horários impostos por nós mesmos, com urgência da constância de fazer, deixamos um pouco de ser. É como se sobrevivêssemos à vida, ao invés de vivê-la de fato.

O metrô continua passando de minutos em minutos, o trânsito continua cheio de carros e businas, o trabalho é o mesmo, sempre com listas de pendências e ar condicionado cheio de sujeira. Os impostos sempre serão cobrados, as filas dos bancos continuam existindo, a comida esfria, a saudade da avó não desaparece. As contas continuam chegando, as nossas caixas de e-mail pipocam de spams e outros slides encaminhados. O armário continua torto, a unha do pé continua encravada.

A gente corre, meio que sem saber o porquê. A gente correio feito barata tonta enquanto p mundo... Ah, o mundo não para enquanto corremos. Assim como não para quando a gente para de correr e começamos observar. A nossa correria não faz com que o Planeta Terra produza mais água. Não impede os acidentes ferroviários com vítimas fatais. E nem mesmo equilibra as alterações da bolsa de valores da China.

Então, paremos um pouco. Correr é cansativo. Não é providencial. É circunstância do nosso entendimento do que a vida nos proporciona. O convite é caminhar até um certo lugar de cada um onde escolheremos parar, sentar e admirar. Se fosse possível parar definitivamente, diria: PARE. Porque enquanto a gente corre, a vida continua acontecendo no mesmo ritmo, que independe de tudo.

É que quando a gente corre, a vida continua dançando à nossa volta. Nós é que entramos em descompasso.

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