quinta-feira, dezembro 11, 2008

Outro Conto de Bichos e filhotes de Bichos

Sai nada. Garganta entalada. Enlatada. Entreaberta. Entrecortada... Entre! Entre alguma coisa.

Eu não consegui gritar quando recebi o telefonema. Não consegui explicar. Nada fiz. Virei bicho.

Transformação quase imperceptível a olho nu. Só aos sentimentos e energias que vibraram diferente. A capa é a mesma. Mas se prestar atenção vê-se que surgem rugas de braveza, olhar de determinação e uma coisa por dentro que toma conta e consome a racionalidade e delicadeza de outrora.

Vira outra coisa. Por dentro um tanto e pouco por fora. Leoa. Leoas são assim, bem bichos da selva, que carregam seus filhotes pela boca e urram bem alto quando não sabem o que dizer ou quando querem dizer um NADA bem grande. Mais ou menos isso que eu fiz.

Peguei as coisas que não pegaria normalmente. Afinal, porque guardar os óculos de grau na caixinha prateada quando vira bicho? Pra que pegar todos os celulares, caneta e papel e jogar tudo dentro da bolsa? E o porquê do cigarro? Não sei. Entre gente e bicho. Coisa meio fera de “me devolve aqui o meu filhote”.

Fui buscá-lo, entre leoa e mãe de gente. Fui rápido. Não olhei pra trás, não fui impedida por mãos que diziam “não, Carol” ou gritos de torcida organizada “como assim, Carol?”. Aí a leoa só rangia os dentes como que “agora, não”, “agora vou resgatar minha cria”.

Bicho é assim. Inconseqüente mesmo. Não quer nem saber. Tem perigos na selva? Fodas-se! Como vai chegar lá? Não interessa! Não quer ajuda? Não! Me viro sozinha.

Coisa meio idiota, meio clichê? É... Coisa meio bicho, meio insana, meio irracional, meio mãe, mesmo. Natureza.

E o maior gosto foi pega-lo como se tivesse recuperado aquele brinquedo roubado. Não! Mais... Pega-lo como se o resgatasse das garras de outro bicho feroz... O bicho “vida grande de menino sem mãe”. E peguei, abracei, cheirei, funguei e beijei. Reconhecimento... Me certifiquei, ainda como leoa, se aquele era o meu filhote mesmo. Era.

Alívio.

Aí fiquei mais gente. Fomos ao shopping, comemos fast food, falamos sobre o último dia de aula dele, sobre estratégias de se conseguir mesas no pior horário do mundo numa praça de alimentação lotada, ele me deu uma bala... Compartilhar. União. Bom. Hum... Cheiro de filho.

Depois de alimentado, adocicado, presenteado, mãe leoa deu um jeito do moleque cria ir-se. E deixou que ele fosse sozinho, mas bem cuidado, sabendo onde e quando. E ele foi. Feliz, dizendo que ‘hoje tinha sido o melhor último dia de aula da vida dele’, sem saber da nada além de ser ficho de gente, de ser o Menino da Mãe.

Foi aí que virei só gente mesmo. A leoa sumiu. Papel cumprido.

Quando lembro do Ponto Cego, daquela “História de Mãe e de Menino”:

“Notando o desinteresse dela,
disfarçado mas real e do qual nem ela se desse conta, pensei que se ficasse para
sempre pequeno eu teria mais chances...”

Tranqüilizo-me. Não se preocupe, Mãe. Nem Menino. Quando não sai nada da garganta entalada, enlatada, entreaberta, entrecortada, é porque todas as forças estão ligadas em outro ponto. O ponto mais implícito, instintivo e impossível de resistir:

O de Ser Mãe de Menino.

Nada nunca muda isso. Afinal, o que resta a uma Mãe senão cuidar do seu Menino?




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