sexta-feira, agosto 24, 2007

Vou processar o meu MP3Player

Eu lia. Eu lia muito. Tinha prazer e até orgulho de ser do “tipo de pessoa” que lê muito.

Eu lia no ônibus, encostada na parede, vendo TV, alongando na aula de circo, no laboratório de informática da faculdade, lia no salão de beleza, caminhando... Lia um livro e meio por semana (média ponderada fundamentada nos meus 27 anos e meio de vida – comecei a ler ainda na barriga de minha progenitora).

Até que: Comprei meu M3Player. Aliás, comprei dois. Dois.

Comecei a gastar meu dinheiro com pilhas AAA e passei a xerocar livros. Odeio livros xerocados (porque adoro as capas), então, deixei de lê-los.

Comecei a passar muito tempo no computador (ai), escolhendo, trocando, baixando músicas. Semanalmente, diariamente.

Ouvia no ônibus, vendo TV, alongando na aula de circo, correndo (Ah!, isso é ótimo. Válido). Ouvia dormindo...

E juntei poeira no “Mestre das Iluminuras”, “1984”, “Benjamim”, “No ar rarefeito”, entre outros. Deixei as palavras na estante. E os livros começaram a pesar inutilmente minha bolsa.

Viciei.

Até tentei ler escutando MP3Player... Mas a leitura era muito densa para a leveza dos meus ouvidos musicais.

E fui me esquecendo... Já não me lembrava mais o que contextualizava “A cura de Schopenhauer” e nem o final do “Caçador de Pipas”. Se ex-adicta, teria que reler tudo para entender.

Meu MP3Payer me trouxe problemas sérios. Preguiça. De ler livros, revistas, jornais, crônicas, blogues, revistas em quadrinhos, sentenças... Faltou-me interatividade com o mundo. Corria mais do que meu corpo esguio deveria correr (nos embalos de Janis Joplin, Jimmy Hendrix, Chico, Caetano, Maria Rita, etc.). E isso me gerou fadiga, câimbras. Tive que comer muitas bananas.

O bendito MP3Player me deixou “out”, por assim dizer. Uma completa imbecil sem informação, sem cultura, sem comunicação direta com o planeta água (ou Terra?).

Quero processar o meu MP3Player porque ele fez de mim uma ET.

Tirou-me o conhecimento generalizado e específico sobre ‘cultura geral’. Não me reciclo mais. Não produzo mais. Apenas ouço. Jamais (hoje), poderia participar do ‘Jogo do Milhão’. Não sei mais nada de política, novos sabores de sorvetes, lançamentos de scarpins Prada, Campeonato Brasileiro de Jogos de Mesa ou das novas tiradas inteligentes da Mafalda.

Quero processar o meu MP3Player por danos neurológicos, morais, intelectuais e ideológicos!

Alguém pode me indicar um bom advogado? Que não tenha celular, I-pod, DVD, calculadoras científicas e que ande de bicicleta? Surdo, de preferência.

3 comentários:

  1. Anônimo17:14

    Concordo plenamente com vc. Também processaria (se tivesse um, é claro) rsrs... Afinal de contas, quem o seu MP3Player pensa que é ? rsrs

    Vc brilhou, como sempre!

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  2. Anônimo11:35

    rsrsrsrsrs. engraçadíssimo texto, parabéns! Mas entendo que não é o mp3 que vc tem que processar... Você na verdade, tem é que REprocessarsse.

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  3. Anônimo09:22

    Te fiz um desafio lá no meu blog. Passa lá. Se você for lá e já estiver em outro tópico, a desafio estar no Sete Coisas Sobre Mim. Um bjo.

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